LXIII
Quando centro de gravidade da vida é colocado, não nela mesma, mas no "além" no nada , então se retirou da vida o seu centro de gravidade. A grande mentira da imortalidade pessoal destrói toda razão, todo instinto natural tudo que há nos instintos que seja benéfico, vivificante, que assegure o futuro, agora é causa de desconfiança. Viver de modo que a vida não tenha sentido: agora esse é o "sentido" da vida... Para que o espírito público? Para que se orgulhar pela origem e antepassados? Para que cooperar, confiar, preocupar-se com o bem-estar geral e servir a ele?... Outras tantas "tentações", outros tantos desvios do "bom caminho". "Somente uma coisa é necessária"... Que todo homem, por possuir uma "alma imortal", tenha tanto valor quanto qualquer outro homem; que na totalidade dos seres a "salvação" de todo indivíduo um possa reivindicar uma importância eterna; que beatos insignificantes e desequilibrados possam imaginar que as leis da natureza são constantemente transgredidas em seu favor não há como expressar desprezo suficiente por tamanha intensificação de toda espécie de egoísmos ad infinitum, até a insolência. E, contudo, o cristianismo deve o seu triunfo precisamente a essa deplorável bajulação de vaidade pessoal foi assim que seduziu ao seu lado todos os malogrados, os insatisfeitos, os vencidos, todo o refugo e vômito da humanidade. A "salvação da alma" em outras palavras: "o mundo gira ao meu redor"... A venenosa doutrina dos "direitos iguais para todos" foi propagada como um princípio cristão: a partir dos recônditos mais secretos dos maus instintos o cristianismo travou uma guerra de morte contra todos os sentimentos de reverência e distância entre os homens, ou seja, contra o primeiro pré-requisito de toda evolução, de todo desenvolvimento da civilização do ressentimento das massas forjou sua principal arma contra nós, contra tudo que é nobre, alegre, magnânimo sobre a terra, contra nossa felicidade na Terra... Conceder a "imortalidade" a qualquer Pedro e Paulo foi a maior e mais viciosa afronta à humanidade nobre já perpetrada. E não subestimemos a funesta influência que o cristianismo exerceu mesmo na política! Atualmente ninguém mais possui coragem para os privilégios, para o direito de dominar, para os sentimentos de veneração por si e seus iguais para o pathos da distância... Nossa política está debilitada por essa falta de coragem! Os sentimentos aristocráticos foram subterraneamente carcomidos pela mentira da igualdade das almas; e se a crença nos "privilégios da maioria" faz e continuará a fazer revoluções é o cristianismo, não duvidemos disso, são as valorações cristãs que convertem toda revolução em um carnaval de sangue e crime! O cristianismo é uma revolta de todas as criaturas rastejantes contra tudo que é elevado: o Evangelho dos "baixos" rebaixa...